21/12/2013

CADA QUAL



            Não mais que de repente, aconteceu.
            O executivo, pensando onde mais sonegar, não a viu iniciando a travessia da rua, com a atenção ainda voltada para onde gastar mais; linda a vitrine desta loja..!
            Não houve tempo para parar. Socorrer, nem pensar; delegacia, B.O., achacamento, etc., etc., solução há de aparecer... Um corpo projetado sobre a calçada, bolsa aberta e todo arsenal de grifes e qualidades espalhados. Nenhum sinal vital aparente.
            Logo, a aglomeração. Curiosos, solidários, passantes, amigos do alheio e comentadores; quanto à culpa, havia divergências. Os conectados twitando, alimentando o Face, tentando as autoridades, em busca de providências, o que já era mais complicado: solicitação anotada, a primeira viatura será enviada para o local, qual é o local?, no momento não há nenhuma disponível, etc., etc.
            O tempo passa, a aglomeração se vai renovando. Corretores seguem para vender mais ilusões; os advogados, de atalaia para novas e oportunas brechas para safar seus réus; banqueiros, céleres, pensando mais juros; os médicos, no azáfama entre convênios e vários empregos; políticos, sempre atentos a novas locupletações, tudo dentro da lei; cada qual segundo sua ambição e possibilidades.
            Com o tempo, resta a vítima, com sinais vitais tímidos, algum tremor , a bolsa vazia e os pertences desaparecidos: menos a contas a pagar. Por companhia, só o mendigo, paciente, esperando sabe-se lá o que, com seu carrinho de feira, o seu guarda- -roupa e propriedades ambulante. Um bom ponto, afinal!
            À distância, preso a um congestionamento no trânsito, o executivo ainda remoe o pensamento, silente: solução há de aparecer...
            “ Respeitável público, é assim que a banda toca..!” diria, se houvesse, o chefe do picadeiro disto que é o nosso mundo contemporâneo.